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Um olhar crítico à construção da escola do professor Fábio Ulhoa Coelho quanto à interpretação do t


A critical look of the School of Professor Fábio Ulhoa Coelho regarding the interpretation of the debtor term in the Judicial Recovery Institute

(Autor) RENALDO LIMIRO Advogado especialista em recuperação judicial. renaldo.limiro@limiroadvogados.com.br

Sumário: Referências Área do Direito: Comercial/Empresarial

Resumo: Este artigo tem por objetivo trazer à lume, conforme enxergamos, as corretas interpretações da palavra devedor em alguns dispositivos da Lei 11.101/2005, bem como suas implicações decorrentes. O art. 1º prescreve que “esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor”. Desde a vigência da LFRE, em 09.06.2005, o Prof. Fábio Ulhoa Coelho iniciou a difusão de um entendimento que redundou numa escola, onde o devedor empresário individual é literalmente alijado do contexto da Lei, e o artigo que dele cuida – o 65 –, é interpretado e aplicado no sentido de se nomear gestor judicial quando do afastamento dos administradores da devedora sociedade empresária, desvirtuando, a nosso sentir, os fins da Lei.

Abstract: This article aims to bring to light, as we see the correct interpretations of the word, debtor, in some provisions of the law 11.101/2005, as well as its implications arising from. Article 1 prescribes that this law is subject to judicial reorganization, Judicial reorganization and bankruptcy of the entrepreneur and the company, hereinafter simply to as debtor.Since the LFRE 09/06/2005, the Professor Fábio Ulhoa Coelho began a diffusion of an understanding that resulted in a School, where the individual entrepreneur debtor is literally lodged in the context of the law, and the article that takes care of, the 65, is interpreted and applied in the sense of appointing judicial manager when the administrator of the debtor company, distorting, to our feelings the porposes of the law. Palavra Chave: Devedor - Afastamento - Destituição - Gestor judicial e administrador. Keywords: Debtor - Removal - Dismissal - Judicial manager and administrator.

Ao longo desses mais de onze anos de vigência da LFRE – 11.101/2005 –, tanto doutrinadores quanto julgadores, em sua grande maioria, caminham por rumos desencontrados quanto à exata interpretação e até mesmo julgamentos de alguns dispositivos onde constam a palavra devedor. Em determinados casos, alguns, por adotarem os pensamentos de doutrinador mais experimentado; em outros, por falta mesmo da correta interpretação e aplicação da Lei.

O legislador, ao dizer no artigo 1º da Lei 11.101/2005 que, “esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor”, o fez no sentido de simplificar, pois, necessariamente, em todo processo de recuperação judicial haverá a figura do devedor, seja ele empresário ou sociedade empresária. E esta figura, independentemente de ser aquele ou esta, será sempre o devedor, seja em que circunstância for. Todavia, este termo devedor, em certas circunstâncias, objetos de nossas análises, receberão dos seus intérpretes e aplicadores, especialmente do Professor Fábio Ulhoa Coelho e os que o seguiram, interpretações e aplicações que, a nosso modesto ver, não correspondem à vontade do legislador.

A utilização da palavra devedor, referindo-se indistintamente ao empresário individual, pessoa física, e à sociedade empresária, pessoa jurídica por seus administradores, exige do intérprete não só uma atenção mais que especial para se saber se ali naquele momento em que ele se depara com a citada palavra, se ela está se referindo ou ao empresário individual, ou à sociedade empresária por seus administradores, ou a ambos. A nosso sentir, isto não é tarefa das mais fáceis, mas não deve desestimular os pensadores do direito; ao contrário, que lhes sirva de incentivo para encontrarem na Lei aquilo que o legislador quis dizer. De nosso lado, com muita humildade, mas também com muita coragem e ousadia, o que acreditamos deva ser um apanágio do pesquisador que busca encontrar na Lei a exata vontade pensada pelo legislador, sem medo de errar e sem medo das críticas –, nos sentimos incentivados para esta tarefa, e nos atrevemos a buscar, a pesquisar, e acima de tudo a pensar, a pensar muito para encontrar ou descobrir em determinadas disposições da Lei 11.101/2005 quando se refere ao devedor, o que quis dizer, o que pensou o legislador. O que nos motivou a isso é, sem dúvida, a escola criada pelo ilustre jurista Fábio Ulhoa Coelho, que deste a criação e vigência da Lei, em 2005, difundiu, ou melhor, criou um rito para a aplicabilidade da Lei 11.101/2005 – esperamos que não de propósito –, o que, aliás, lhe debitamos como equívoco ou equívocos. Mas o ilustre doutrinador, ao omitir a literalidade da Lei e em seu local implantar uma redação própria, alijou dela a figura do devedor empresário individual e passou a defender e a advogar (os seus escritos o dizem) que somente a devedora sociedade empresária é que seria a legitimada para a recuperação judicial, e, a nosso ver, num conjunto de interpretações distorcidas e confusas quanto aos termos devedor, afastamento, destituição, gestor judicial, administradores, fez escola e conquistou muitos seguidores. Vamos, todavia, com muita humildade, tentar mostrar os equívocos do Mestre. No fundo da questão, este grande pensador do direito, a quem rendemos todas as vênias, a quem sempre citamos respeitosamente em nossas obras e artigos, com quem sempre estamos aprendendo sempre, por estes predicados nos faz crer que foi profundamente traído em um momento por suas sempre maravilhosas interpretações.Não queremos, de outro lado, acreditar que ele o fez propositadamente, pois a sua grandeza não o permitiria. Mas, foi tão grave o equívoco cometido pelo ilustre jurista que, ao transcrever um dispositivo da Lei, cometeu ao mesmo tempo três erros: (i) citou a alínea incorreta; (ii) não transcreveu com as letras da Lei o inteiro teor do dispositivo; e, (iii) inseriu em seu lugar uma redação inexistente em toda a Lei 11.101/2005. É grave, porque decorrentemente da redação criada por Fábio Ulhoa Coelho, ao mencionado dispositivo, fez-se escola. Da mesma forma e com o mesmo sentido que ele imprimiu sua redação na sua obra lançada em 2005, também o fez na sua última obra lançada neste ano de 2016. Diferentemente também não o fez em suas obras de 2011 e 2014. A grande verdade é que o termo devedor, em determinadas circunstâncias da Lei 11.101/2005, refere-se exclusivamente ao devedor empresário individual, em outras, exclusivamente às sociedades empresárias, e ainda em outras, a ambos, residindo aqui, a nosso modesto ver, os equívocos do grande Professor Ulhoa. Para uma melhor compreensão, vamos utilizar de uma sequência nas nossas exposições sobre o tema em foco: (i) começando pelo nosso modesto entendimento dos citados dispositivos da Lei 11.101/2005 que a seguir transcreveremos; (ii) seguido pelos entendimentos do doutrinador e Prof. Fábio Ulhoa sobre os mesmos e suas consequências, que fizeram escola; (iii) transcrevendo julgados de alguns Tribunais regionais que seguem a escola do Mestre; e, (iv) finalmente, transcrevendo os ensinamentos da Lei Complementar 95/1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das Leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos administrativos que menciona, corroborados por comentários de expert no assunto. Passamos a examinar, portanto, alguns dispositivos da Lei 11.101/2005, os mais importantes, a nosso ver, onde a palavra devedor fez e faz com que muitos pensadores, com origem nos ensinamentos do Professor Fábio Ulhoa Coelho a interpretam, a nosso sentir, contrariando o que quis dizer o legislador. São os seguintes: 1) “Art. 27. O Comitê de Credores terá as seguintes atribuições, além de outras previstas nesta Lei: I – (...); II – na recuperação judicial: a) (...); c) submeter à autorização do juiz, quando ocorrer o afastamento do devedor nas hipóteses previstas nesta Lei, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e outras garantias, bem como atos de endividamento necessários à continuação da atividade empresarial durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial”. 2) “Art. 35. A assembléia-geral de credores terá por atribuições deliberar sobre: I – na recuperação judicial: (...); e) o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor”. 3) “Art. 64. Durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, salvo se qualquer deles: I – houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente; II – houver indícios veementes de ter cometido crime previsto nesta Lei; III – houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores; IV – houver praticado qualquer das seguintes condutas: a) efetuar gastos pessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial; b) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas; c) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular; d) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação de que trata o inciso III do caput do art. 51 desta Lei, sem relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial; V – negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê; VI – tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial. Parágrafo único. Verificada qualquer das hipóteses do caput deste artigo, o juiz destituirá o administrador, que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor ou do plano de recuperação judicial”. 4) “Art. 65. Quando do afastamento do devedor, nas hipóteses previstas no art. 64 desta Lei, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial. § 1 º O administrador judicial exercerá as funções de gestor enquanto a assembléia-geral não deliberar sobre a escolha deste. § 2 º Na hipótese de o gestor indicado pela assembléia-geral de credores recusar ou estar impedido de aceitar o encargo para gerir os negócios do devedor, o juiz convocará, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, contado da recusa ou da declaração do impedimento nos autos, nova assembléia-geral, aplicado o disposto no § 1 º deste artigo”. (i) A nossa visão sobre os dispositivos seguintes acima transcritos da Lei 11.101/2005. Na nossa modesta visão, os acima citados e transcritos artigos 27, II, c, 35, I, e, e 65 e parágrafos, tratam do afastamento do devedor empresário individual, enquanto que o art. 64 e seu parágrafo único cuidam da destituição do devedor sociedade empresária, por seus administradores. E que tanto as causas para o afastamento do devedor empresário individual quanto as causas para a destituição do devedor sociedade empresária, por seus administradores, são as mesmas previstas no caput do artigo 64. Só o devedor empresário individual é que pode ser afastado e terá sua atividade empresarial assumida pelo gestor judicial (art. 65), enquanto o devedor sociedade empresária, por seu turno, tem seus administradores destituídos e substituídos na forma prevista nos constitutivos ou do plano de recuperação judicial. De outro lado, complementa o caput deste artigo 64 que, tanto o devedor empresário individual quanto o devedor sociedade empresária, esta por seus administradores, durante o procedimento de recuperação judicial, serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, a não ser que cometam qualquer das irregularidades acima mencionadas (nº 3). Dipõe o art. 27, II, c, que ao Comitê de Credores cabe a responsabilidade de, durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial, e já afastado o devedor empresário individual, e em havendo necessidade, submeterá à autorização do juiz do feito as reais condições econômico financeira da atividade do devedor, para que ele autorize quanto à disposição de bens, constituição de ônus, dentre outros, desde que necessário para a continuidade da atividade. Isto porque, ao ser afastado este devedor empresário individual, ninguém o sucederá, ninguém o substituirá. Ele é só, não tem administrador, e é o titular de suas atividades. Daí, a necessidade instituída pelo legislador de, em ocorrendo o afastamento do devedor empresário individual naquele curto espaço de tempo que medeia o pós-deferimento do processamento da recuperação judicial até a efetiva aprovação do plano, ter alguém que zele pela continuidade da atividade. Ora, pois afastado o devedor empresário individual das suas atividades, não há quem legalmente o substitua. E por que essa necessidade de somente “... durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial?”. Primeiramente, porque o devedor empresário individual – e se cometer a (as) irregularidades/infrações previstas no artigo 64 –, será afastado da condução das suas atividades empresarias somente durante o procedimento de recuperação judicial (art. 64), significando a realização deste ato pelo juiz do feito após o respectivo deferimento do processamento e antes da aprovação do plano de recuperação judicial. Na ocorrência de tal hipótese, diz a Lei “...o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial” (art. 65). Conforme se observa nas disposições ora transcritas, é aqui, e somente aqui nesta hipótese – a do afastamento do devedor empresário individual –, que há a necessidade de um ser individualizado de todos os órgãos da recuperação judicial, qual seja, a figura do gestor judicial, cuja incumbência que lhe determina a Lei é a de assumir a administração das atividades do devedor empresário individual, que não foi destituído e tampouco substituído. Este devedor foi afastado da condução das suas atividades. A nosso ver, e ao contrário de alguns entendimentos, como o do eminente jurista LOBO; Jorge. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, Paulo F.C. Salles de Toledo e Carlos Henrique Abrão (coords). 4.Ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2010. p. 247, este afastamento do devedor empresário individual é temporário, mesmo que tenha violado o artigo 64, I a V, e não definitivo, conforme pensa o grande jurista. Isto porque este devedor empresário individual, até mesmo se condenado foi, mais cedo ou mais tarde vai cumprir a penalidade que lhe foi imposta e será reabilitado, nada o impedindo, por consequência, de voltar à condução da sua atividade, de algo que é dele, pessoa física. Ocorrida a hipótese – a do afastamento do devedor empresário individual –, ficará sob a responsabilidade da assembleia geral de credores, por convocação do juiz condutor do feito, as deliberações sobre a escolha do nome do gestor judicial, o qual, repetimos, assumirá a administração das atividades do devedor empresário individual. De outro lado, prevendo o legislador a possível inexistência do Comitê de Credores (é órgão facultativo da recuperação judicial) e as dificuldades naturais para se encontrar um nome que queira assumir como gestor judicial as atividades do devedor empresário individual, previu que o adminstrador judicial (este sempre funcionará em qualquer processo de recuperação judicial) exercerá as funções daquele até que a AGC encontre quem queira e esteja disponível à assunção de tais funções (§§ 1º e 2º do artigo 65). Daí justificar-se a exigência da Lei quanto a “...durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial” (art. 27, II, c). As disposições do art. 35, I, e, da Lei 11.101/2005. Cuida este dispositivo de uma das atribuições da Assembleia Geral de Credores na recuperação judicial, qual seja, a de deliberar sobre o nome do gestor judicial quando do afastamento do devedor. E esse devedor é também o empresário individual, como o é o das disposições do acima comentado Artigo 27, II, c. Em ambos os casos só diferem os órgãos da recuperação judicial, sendo este o Comitê de Credores e aquele a Assembleia Geral de Credores, cada qual com sua atribuição específica dentro do processo de recuperação judicial, ou seja, respectivamente, submeter à autorização do juiz, e se necessário para a continuidade da atividade, medidas para que o mesmo as aprove, e deliberar sobre o nome do gestor judicial, mas tudo decorrente do mesmo evento, afastamento do devedor – o empresário individual, a nosso ver. As disposições do art. 65 e §§ 1º e 2º da Lei 11.101/2005. Analisamos primeiramente (antes que o art. 64 e seu parágrafo único) as disposições deste artigo 65 e seus parágrafos, que também tratam do afastamento do devedor. E este devedor é também o empresário individual. E aqui, o caput deste art. 65, realça que as hipóteses para tal são todas as previstas no artigo 64. Por cometimento de qualquer uma delas, diz a Lei, será o devedor (empresário individual) afastado, oportunidade em que o juiz convocará a assembleia geral de credores (art. 35, I, e), para as deliberações sobre o nome do gestor judicial que assumirá as atividades desse devedor. Esse gestor judicial não virá substituir o devedor, pois este não foi e não pode ser destituído; o gestor judicial simplesmente assumirá a continuidade das suas atividades. E, diante da natural demora da realização dessa AGC e até a efetiva escolha do gestor judicial, diz a Lei, que o administrador judicial exercerá as funções do gestor judicial (§§ 1º e 2º). O art. 64 e seu parágrafo único da Lei 11.101/2005. Por último, as disposições da Lei 11.101/2005 que tratam, segundo nossa visão, do devedor sociedade empresária, pessoa jurídica, e que cuidam da destituição e substituição dos seus administradores quando cometerem as mesmas infrações/irregularidades previstas no caput deste artigo 64, que são também as mesmas que causam o afastamento do devedor empresário individual. Nada obstante isso, a devedora sociedade empresária submete-se a outro procedimento para a destituição de seus administradores, previsto no parágrafo único do art. 64, que diz que “verificada qualquer das hipóteses do caput deste artigo, o juiz destituirá o administrador, que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor ou do plano de recuperação judicial”. Até mesmo se o devedor sociedade empresária tiver o afastamento de seu administrador previsto no plano de recuperação judicial (art. 64, VI), ainda assim, diz a Lei, o juiz o destituirá, mas não o afastará. E o substituirá, ou conforme a previsão dos atos constitutivos (entendidos aqui o contrato social para as demais sociedades empresárias e o Estatuto Social, atas de assembleias de eleição e posse para as Companhias), ou conforme a previsão no plano de recuperação judicial. (ii) Uma síntese do pensamento do eminente jurista e ilustre Professor Fábio Ulhoa Coelho sobre sua forma de interpretação e aplicação da palavra devedor sobre os dispositivos ora analisados: Eis, pois, pensamento do eminente Professor, Mestre, Doutor e brilhante advogado, além de respeitadíssimo jurista, por certo o mais citado em obras de recuperação judicial e falência, bem como em decisões de todos os Egrégios Tribunais do país, inclusive os Superiores, além de ser também um dos pioneiros a interpretar artigo por artigo da Lei 11.101/2005, além de ter contribuído com sua experiência e sabedoria específicas da área para a conversão do projeto que se tornou na lei ora sob análise, sobre os dispostivos em foco – a palavra devedor. Comentando em sua mais recente obra, Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, 11ª Edição, 2ª tiragem, Revista dos Tribunais, 2016, sobre a competência do Comite na recuperação judicial (art. 27, II, c da Lei 11.101/05), às páginas 122, diz o Mestre: “... A segunda competência do Comitê estranha à função de fiscalização tem natureza administrativa. Quando o juiz determina o afastamento da administração da sociedade em recuperação judicial, cabe ao Comitê cuidar das alienações de bens do ativo permanente e dos endividamentos necessários à continuação da atividade empresarial, submetendo à autorização do juiz as medidas administrativas a ele relacionadas. (...). (grifamos). Aqui nesses seus comentários, ao invés do eminente Professor transcrever o que diz a literalidade da Lei, ou seja, “submeter à autorização do juiz, quando ocorrer o afastamento do devedor...”, escreve ele: “quando o juiz determina o afastamento da administração da sociedade em recuperação judicial...” (art. 27, II, c). Ora, em nenhuma letra da Lei 11.101/2005 existe a disposição que o digno doutrinador escreveu. E isto ele o faz desde a primeira edição da sua obra, então denominada Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação Judicial (Lei n. 11.101, de 9-2-2005), Editora Saraiva, 2005, conforme se pode ver às páginas 77-78. Fábio Ulhoa omite a palavra devedor e insere em seu lugar as palavras administração da sociedade em recuperação judicial. Nos fica claro, salvo melhor entendimento e com toda vênia, que o nobre Professor entende que quem submete-se ao afastamento, nesta hipótese, não é o devedor empresário individual, mas sim a sociedade empresária. Aqui, entendemos, que foi o início da escola criada pelo eminente causídico. No mesmo sentido, ao comentar sobre o art. 35, I, e – competência da assembleia geral de credores –, na mesma obra de 2016, às páginas 133, o Professor continua na sua mesma linha de raciocínio e, a nosso ver, talvez tenha cometido aqui o maior equívoco de sua vida de doutrinador. Repetimos: não queremos acreditar que o Mestre o tenha feito propositadamente. É que a Lei 11.101/2005 lista em seu artigo 35, no Inciso I, todas as atribuições da AGC na recuperação judicial, fazendo-o nas alíneas a até a alínea f, sendo vetadas as disposições então contidas na alínea c. Eis a exata transcrição dos comentários do Prof. Ulhoa sobre a questão: “Já na recuperação judicial, a competência da Assembleia dos credores compreende: a) aprovar, rejeitar e revisar o plano de recuperação judicial; b) aprovar a instalação do Comitê e eleger seus membros; c) manifestar-se sobre o pedido de desistência da recuperação judicial; d) eleger o gestor judicial, quando afastados os diretores da sociedade empresária requerente; e) deliberar sobre qualquer outra matéria de interesse dos credores. (grifamos). Este equívoco do Professor foi triplo, pois (i), ao transcrever a literalidade da Lei, omitiu a alínea c (Vetado); (ii) atropelou a ordem das demais alíneas, aproveitando a c para transcrever o que diz a d, e transcrevendo na e o que diz a f; e, por fim, (iii) ao invés de transcrever o que diz a Lei na alínea e “o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor”, escreve na alínea d “eleger o gestor judicial, quando afastados os diretores da sociedade empresária requerente” (grifamos). Mais uma vez nos dá a entender o Professor, ao voltar a omitir o termo grafado pela Lei – devedor –, que quem se submete ao afastamento são os diretores da devedora sociedade empresária requerente da recuperação judicial. Ou seja, para o Professor, nas hipóteses ora sob análise, o devedor será sempre a sociedade empresária. Ficando, ao final dessas observações sobre este dispositivo ora analisado (art. 27, II, e da Lei 11.101/2005), que este pensamento e a forma de se expressar do nobre Professor Fábio Ulhoa Coelho, é o mesmo desde 2005, quando da edição primeira da obra acima mencionada, encontrável às páginas 88. Seguindo, passamos a analisar o pensamento de Ulhoa sobre o art. 64 e seu parágrafo único da Lei 11.101/2005. Segundo o que ele pensa, a palavra devedor, tantas vezes repetidas na Lei, é sempre substituída pelas palavras sociedade empresária. Da mesma forma, às páginas 263-264 da sua mais recente obra, de 2016, acima citada, diz o Professor quanto ao que dispõe o art. 64: “186. Substituição da administração da empresa em recuperação. Quanto à administração da sociedade beneficiada pela recuperação judicial, há duas hipóteses a considerar. Se os administradores eleitos pelos sócios ou acionista controlador estão se comportanto lícita e utilmente, não há razões para removê-los da administração. Caso contrário, o juiz determinará o afastamento. (...) O afastamento do sócio ou acionista controlador dar-se-á pela suspensão do seu direito de voto na assembléia geral da sociedade anônima em recuperação; já a do administrador, mediante a destituição do cargo”. Ao dizer o Professor “já a do administrador...”, entendemos que ele está se referindo à suspensão deste das suas funções, semelhantemente ao que disse sobre o sócio acionista ou controlador. Ou seja, que a destituição do cargo de administrador dar-se-á pela suspensão. Segue o Professor: “Variam as consequências conforme seja determinado o afastamento do sócio ou acionista controlador ou do administrador da sociedade em recuperação. Se o afastado é o sócio ou acionista controlador, a consequência está disciplinada no art. 65 (nomeação de gestor judicial); se o afastado é administrador, a disciplina se encontra no parágrafo único do art. 64 (substituição na forma do estatuto ou contrato social)”. (Este último parágrafo foi acrescentado pelo Professor na última edição de sua obra, a de 2016). A nosso ver, talvez fosse melhor deixar como se encontrava na redação original. A palavra devedor continua desaparecida do dicionário do Professor Ulhoa, cedendo seu lugar para as palavras administração da empresa em recuperação, ou administração da sociedade, ou administradores, ou sócio, ou acionista controlador. A visão dele, a cada análise dos dispositivos ora sob estudos, se nos torna mais clara de que o devedor será sempre a sociedade empresária. Observamos que o Professor faz incursões em seus comentários em temas completamente estranhos ao que diz Lei, quando afirma que as consequências variam para os destinatários em conformidade com o afastamento, sendo este ou do sócio ou acionista controlador, ou do administrador da sociedade em recuperação. Nos deixa claro o Mestre que ao referir-se ao afastamento do sócio ou acionista controlador, está tratando o mesmo da administração das Companhias, e que a solução para o afastamento nesta hipótese encontra-se nas disposições do Art 65 desta Lei, ou seja, a nomeação de gestor judicial; já quanto ao afastamento do administrador, e aqui nos parece estar o Professor cuidando das demais sociedades empresárias, a disciplina é a prevista no parágrafo único do art. 64. Ora, muito longe de existir em qualquer termo da Lei 11.101/2005 essa doutrinação do Mestre Fábio Ulhoa. Tanto as consequências quanto à disciplina para a destituição e não afastamento do sócio ou acionista controlador, quanto para os administradores das demais sociedades empresárias, encontram-se disciplinadas no parágrafo único do artigo 64, ou seja, a destituição com a consequente substituição na forma prevista nos atos constitutivos do devedor (compreendidos aqui o contrato social, estatutos, atas de assembleias gerais de eleição, de posse) ou do plano de recuperação judicial. De outro lado, a consequência por ele encontrada no art. 65 – nomeação de gestor judicial –, absolutamente nada tem a ver com o afastamento de sócio ou acionista controlador (estes são destituídos e substituídos, mas nunca afastados), pois os destinatários das disposições do artigo 65 são somente os devedores (empresários individuais). (grifamos). O artigo 65 e seus parágrafos 1º e 2º, como últimos dispositivos sob análise, cujo foco é a palavra devedor, merecem, a exemplo dos demais também analisados, as observações, as considerações e os pensamentos do ilustre jurista Fábio Ulhoa Coelho, como seguem: Sob o título “147. O gestor judicial”, assim doutrina: “Determinando a destituição da administração da sociedade empresária requerente do benefício, o juiz deve convocar a Assembleia de credores para a eleição do gestor judicial. Trata-se da pessoa a quem será atribuída a administração da empresa em recuperação. (Esta redação consta das edições das obras do Professor Fábio Ulhoa desde 2005 a 2014). Porém, na sua 11ª Edição, Revista dos Tribunais, 2016, eis que surge no dicionário de Fábio Ulhoa a palavra devedor, pois o mesmo modificou sua redação de dez anos, ficando assim a redação do parágrafo acima citado: “187. O gestor judicial. Determinando a destituição do devedor, o juiz deve convocar a assembleia de credores para a eleição do gestor judicial. Trata-se da pessoa a quem será atribuída a administração da empresa em recuperação” (grifamos). Nada obstante essa luz permear o pensamento do digno Mestre, logo, logo se apagou, pois ao continuar expressando os seus pensamentos, afirmou que o gestor judicial é “a pessoa a quem será atribuída a administração da empresa em recuperação”. (Grifamos). Ora, o devedor empresário individual não tem administrador. É ele que é, segundo afirma a Lei, o titular do seu empreendimento, que é levado à inscrição na Junta Comercial de seu respectivo Estado, cuja inscrição far-se-á mediante simples requerimento que contenha o seu nome, nacionalidade, domicílio, estado civil, a firma com a respectiva assinatura, o capital, o objeto e a sede da empresa (artigo 967 e 968) do Código Civil. Continuando, escreve o jurista: “Ao gestor compete dirigir a atividade econômica e implementar o plano de recuperação, após sua aprovação. Ele passa a ser o representante legal da sociedade devedora nos atos relativos à gestão da empresa (assinatura de cheques, contratação de serviços, compra de insumos, prática de atos societários etc.). O gestor não se torna, porém, o representante da sociedade em recuperação para todos os fins. Nos atos relativos à tramitação do processo de recuperação judicial, a sociedade devedora continuará sendo representada nos termos de seus atos constitutivos. Este dispositivo também se aplica no caso de afastamento de acionista ou sócio controlador”. (Este parágrafo foi acrescentado na última edição da obra do Mestre, de 2016). Assim, destituídos, por exemplo, todos os diretores, caberá aos sócios da limitada ou ao órgão competente da anônima (Assembleia geral dos acionistas ou Conselho de Administração) a eleição dos substitutos. A esses competirá, por exemplo, apresentar o plano de recuperação (se ainda não havia sido apresentado), prestar informações ao administrador judicial ou ao juiz, apresentar os relatórios etc. Essa duplicidade de representação prevista na lei é desastrosa. Será, certamente, fonte de inúmeras disputas e indenifinições, capazes até mesmo de paralisar a empresa e comprometer o esforço despendido em busca de sua recuperação. O representante legal eleito nos termos dos atos constitutivos, por exemplo, não terá responsabilidade nenhuma pelos atos de gestão, e, portanto, não será equiparado à sociedade falida para fins penais, caso ocorra a convolação da recuperação em falência. O gestor, por sua vez, terá sempre limitados os seus poderes de gestão, já que não fala pela sociedade devedora nos atos processuais”. (Todos os grifos são nossos). (Estes dois últimos parágrafos constam das obras do Professor desde a Edição de 2005 até a 10ª ed., de 2014). Foram excluídos da última Edição, a 11ª, de 2016, agora com a Editora Revista dos Tribunais. Nossas loas ao Professor por este ato – a mencionada exclusão –, pois ao pensarmos sobre os mesmos, ficamos a imaginar o que teria levado uma mente tão brilhante a assim pensar e escrever durante exatos dez anos, cujo conteúdo a nós nos falta sequência lógica? Como poder-se-ia compreender a expressão do pensamento do digno Mestre, quando num determinado momento afirma que “Ao gestor compete dirigir a atividade econômica e implementar o plano de recuperação, após sua aprovação”, isto é, a este gestor são outorgadas competências somente após a apresentação do plano de recuperação, as quais são limitadas, pois “Ele passa a ser o representante legal da sociedade devedora nos atos relativos à gestão da empresa (assinatura de cheques, contratação de serviços, compra de insumos, prática de atos societários etc)”. E que dentro dessas limitações a este gestor (o judicial) impostas, ele compartilha o exercício das atividades da empresa com outros, pois “Nos atos relativos à tramitação do processo de recuperação judicial, a sociedade devedora continuará sendo representada nos termos de seus atos constitutivos”. Como? Seria possível ao gestor judicial dirigir a atividade econômica e implementar o plano de recuperação judicial ao mesmo tempo em que, nos atos relativos à tramitação desse processo de recuperação judicial a sociedade recuperanda estaria sendo representada nos termos dos seus atos constitutivos? Ou seja, essa atividade econômica em recuperação judicial teria, pelas expressões de Fabio Ulhoa Coelho, a administração compartilhada entre o gestor judicial eleito pela assembleia geral de credores e os respectivos administradores, conforme o ato constitutivo. Não! Isto não está na Lei. O Professor Ulhoa não obedeceu aqui os mandamentos da LC 95/1998, que diz que se deve restringir o conteúdo de cada artigo da Lei a um único assunto ou princípio, e que deve se expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida (art. 11, III, b e c). O que fez o Mestre? Ao tentar explicar o inexplicável, utiliza-se das disposições do artigo 64 em seu parágrafo único, que tem como destinatária a devedora sociedade empresária (é um assunto ou um princípio), pois os administradores desta, cometendo as infrações do caput deste artigo 64 estão sujeitos à destituição e subsequente substituição, “na forma prevista nos atos constitutivos do devedor ou do plano de recuperação judicial” e, ao mesmo tempo, utiliza-se também das disposições do artigo 65, cujo destinatário é o devedor empresário individual (é também um outro assunto ou outro princípio), que está sujeito ao afastamento e que o gestor judicial simplesmente assumirá o exercício de suas atividades. Assim, incompreensível e ilógico o raciocínio do ilustre Mestre. Mas ele teve seguidores; ele formou essa escola. Exemplos de seguidores da escola do Prof. Fábio Ulhoa Coelho, aqui citados como exemplos, dentre os inúmeros existentes por este Brasil afora: Tribunal de Justiça de Santa Catarina: “Agravos de Instrumento n. 2012.073350-8, 2012.071659-5, 2012.072402-8, 2012.071660-5, da comarca de Joinville (5ª Vara Cível), em que são agravantes Amarildo Chaves Flores e outros, e agravadas Busscar Ônibus S.A. e outras. A Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos e dar-lhes provimento para o fim de reconhecer a nulidade da Assembléia-Geral de Credores e desconstituir a decisão que decretou a falência das recuperandas. Determina-se o afastamento dos sócios/devedores da administração da empresa, cabendo ao administrador judicial cumprir o artigo 65, § 1º da LFR grifamossos). Fseu voto, o digno Relator faz a seguinte refer nto, a nossa vistes tivamente estres retrocitados.enquanto não deliberada a escolha do gestor judicial (art. 65, caput, LRF). Custas legais. (grifamos). O julgamento, realizado no dia 26 de novembro de 2013, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Lédio Rosa de Andrade, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Saul Steil. A certa altura de seu voto, o digno Relator faz a seguinte referência ao Professor Fábio Ulhoa: “Sobre tal perfil, eis as palavras esclarecedoras do Prof. Fábio Ulhoa Coelho”: ‘Em toda recuperação judicial, como auxiliar do juiz e sob sua direta supervisão, atua um profissional na função de administrador judicial. Ele, em geral, é pessoa da confiança do juiz, por este nomeado no despacho que manda processar o pedido de recuperação judicial. Se, porém, o nomeado pelo juiz for substituído pela Assembleia dos Credores, a competência para a escolha do substituto é desse órgão colegiado. [...] Na recuperação judicial, as funções do administrador judicial variam de acordo com dois vetores: caso o Comitê, que é órgão facultativo, exista ou não; e caso tenha sido ou não decretado o afastamento dos administradores da empresa em recuperação”. (...) (grifamos). “Pelo segundo vetor, o administrador judicial é investido no poder de administrar a empresa e representar a sociedade empresária requerente da recuperação judicial quando o juiz determinar o afastamento dos seus diretores, enquanto não for eleito o gestor judicial pela Assembleia Geral. Somente nesse caso particular, tem ele a prerrogativa de se imiscuir por completo na intimidade da empresa e tomar as decisões administrativas atinentes à exploração do negócio. Não tendo o juiz afastado os diretores ou administradores da sociedade empresária requerente da recuperação judicial, o administrador judicial será mero fiscal dessa, o responsável pela verificação dos créditos e o presidente da Assembleia dos Credores (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas: (Lei nº 11.101/2005). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 71-72)”. (grifamos). Acórdãos recentes do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo onde consta a existência da figura do gestor judicial em recuperação judicial de sociedade empresária: 1) “Agravo de Instrumento – Recuperação Judicial – Afastamento dos administradores da recuperanda e conselheiros administrativos, nomeação de gestora judicial e indisponibilidade de todos os bens de propriedade direta e indireta da pessoa jurídica, dos administradores e conselheiros, dos sócios e ex-sócios. – Recurso neste ponto Prejudicado, em razão da superveniente declaração de falência”. (grifamos). (...) Agravo de Instrumento – conheceram em parte do recurso e na parte conhecida, deram provimento. (Relator(a): Ramon Mateo Júnior; Comarca: Bauru; Órgão julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 11/11/2015; Data de registro: 16/11/2015)” (grifamos). 2) “Recuperação Judicial. Destituição dos sócios da gestão da empresa recuperanda. Negativa de prestação de informações requeridas pelo administrador judicial. Assembleia de credores não agendada, um ano e meio após a decretação da recuperação judicial. Empresa que suspendeu suas atividades. Nomeação de outro gestor judicial necessária. Artigo 64, IV, 'c', e V, da Lei nº 11.101/05. Cerceamento de defesa não caracterizado. Necessidade de convocação imediata de assembleia geral de credores para deliberar sobre o novo gestor judicial. Artigo 65 da Lei nº 11.101/05. Recurso não provido, com determinação. (Relator(a): Tasso Duarte de Melo; Comarca: Jundiaí; Órgão julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 16/10/2012; Data de registro: 16/10/2012” (grifamos). Tribunal de Justiça da Bahia. Processo AI 00020417120138050000 BA 0002041-71.2013.8.05.0000, cuja Relatora é a eminente Desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago, julgado em 18.02.2014, pela 3ª Câmara Cível e publicado no dia 19.02.2014” “Agravo de instrumento. Recuperação judicial. Perda superveniente de objeto. Abertura de edital de convocação de administrador judicial. O inconformismo, que tem como real escopo a pretensão de reformar o decisum, não há como prosperar, porquanto o presente recurso encontra-se prejudicado, pela perda superveniente do seu objeto, tendo em vista que o Juízo a quo, através da abertura de Edital de convocação para realização de Assembleia Geral, cuja primeira convocação se deu em 02/05/2013, determinou a deliberar sobre nomeação temporária de um gestor judicial para a Recuperanda até a solução da demanda em torno da matéria (...)” (grifos nossos). Ingerência do Judiciário. Consequências. No nosso modo de ver, essas decisões do Judiciário determinando o afastamento (na realidade, o termo técnico correto é destituição) dos administradores de devedora sociedade empresária e “nomeando gestor judiciais”, constitui-se em ingerência nas administrações das sociedades recuperandas que sofrem tais atos, pois, tanto o Código Civil quanto a Lei 6.404/1976 (das Companhias) regulam de maneira muito clara – e isto é lei, a forma pela qual os administradores societários são substituídos quando destituídos. Essas “nomeações de gestores judiciais” efetuadas ao arrepio da Lei e com base na escola do Professor Fábio Ulhoa podem proporcionar a quem sofreu tal ingerência, e se houver prejuízos ao recuperando por má gestão do “nomeado”, pedido de indenização contra o respectivo Estado. A Lei Complementar 95, de 26.02.1998, que dispõe sobre a elaboração, redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constitução Federal, e estabelece normas para normas para a consolidação dos atos administrativos que menciona. O legislador, por óbvio, ao confeccionar a Lei 11.101/2005, seguiu os mandamentos da acima citada Lei Complementar 95/1998, regulamentada pelo Decreto 4.176, de 28 de março de 2002, de cujos princípios e técnicas nos utilizaremos agora, para, a nosso ver, ter-se uma perfeita compreensão das corretas interpretação e aplicação da LFRE. O conteúdo de cada artigo da lei deve se restringir a um único assunto ou princípio. Esta Lei nos ensina, na alínea b do Inciso III do art. 11, “que se deve restringir o conteúdo de cada artigo da lei a um único assunto ou princípio”; e, na alínea seguinte, a “c”, que se deve “expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida”. (grifamos). Acreditamos que pode estar nestes ensinamentos a resposta para tantos desencontros sobre a interpretação e o julgamento dos dispositivos ora questionados, pelo insigne doutrinador e julgadores que o seguiram. A lição de quem é Professor na interpretação das leis. O Dr. Sylvio Motta, Professor da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro (Emerj) e diretor do curso Companhia dos Módulos, em seu extraordinário artigo publicado no Boletim de Notícias Conjur, de 12 de junho de 2009, sob o título “Para entender a lei, é preciso saber como ela foi escrita”, nos ensina como se interpretar uma Lei. Após estabelecer alguns parâmetros sobre técnicas de redação e interpretação legislativas e demonstrar, que formalmente, os textos legais serão articulados com observância de diversos princípios, o Professor Sylvio Motta diz: “Estabelecidos estes conceitos, convém entender como se deve estudar um artigo de uma lei. O artigo é a menor porção de uma lei que ainda guarda as suas características. Sendo assim, a forma correta de interpretar um artigo é concêntrica e não linear, ou seja, deve-se entender que o centro orbital de um artigo é o seu caput, tudo o circunstancia: os parágrafos, incisos, alíneas e itens que porventura o integram. Assim, a interpretação exige certo grau de abstração do intérprete para que, em uma visão espacial mais acurada, compreenda que os parágrafos, por exemplo, são subdivisões do assunto do caput, enquanto os incisos são exemplificações do assunto do parágrafo ou do próprio caput; já as alíneas são enumerações (quase sempre taxativas) do conteúdo dos parágrafos; e, finalmente, os itens são enumerações do assunto que está na alínea. Dessa forma, a compreensão do artigo se torna mais fácil uma vez que o estudante já consegue entender quais foram os parâmetros formais que nortearam a sua redação”. (grifamos). Com base nos mandamentos da LC 95/1998 e nos ensinamentos do Professor Sylvio Motta, acima transcritos, vamos procurar a compreensão deste parágrafo único do art. 64, pois que os parágrafos, “...são subdivisões do assunto do ‘caput’ ...”, e que por meio deles “são expressos os aspectos complementares à norma enunciada no ‘caput’ do artigo e as exceções à regra por este estabelecidas”. (os grifos são nossos). Ora, a norma enunciada no caput do art. 64 é a de que “durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial..., salvo se qualquer deles: I (...), II (...)”. E prescreve regras nos seis incisos, as quais, se infringidas (as cinco primeiras) ou exercitada (a última), diz o parágrafo único que, “o juiz destituirá o administrador, que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor...” (primeira parte: incisos I ao V) “...ou do plano de recuperação judicial” (segunda parte: inciso VI), cumprindo, assim, plenamente os pressupostos acima explicitados, ou seja, expressando os aspectos complementares à norma estabelecida no caput, qual seja, a destituição do administrador com a consequente substituição, se “verificada qualquer das hipóteses do caput...”. (grifamos). O significado da palavra destituição, segundo De Plácido e Silva. Em seu tradicional e respeitadíssimo “Vocabulário Jurídico”, Vol II, Ed. Forense, p. 519, De Plácido e Silva descreve o significado e a origem da palavra: “Destituição. Derivado do latim destitutio de destituere (privar), designa o fato de ser alguém privado da função ou autoridade, de que era investido. Difere, acentuadamente, da renúncia ou exoneração, em que esta pode ser voluntária, enquanto a destituição significa uma demissão do cargo ou função indendentemente da vontade do ocupante. Em referência aos poderes conferidos, também ocorre a destituição, que se entende uma revogação deles. (...) Mas, não se pense que a destituição significa abolição ou supressão do cargo ou função. Pela destituição, somente a pessoa se remove, pela privação ou revogação dos poderes que lhe eram atribuídos, ou das funções que lhe eram conferidas. Mas o cargo e a função persistem. Na abolição, há a extinção do cargo e da função”. (os grifos são nossos). Destituido das funções de administrador da sociedade empresária independentemente de sua vontade, haverá a substituição do mesmo, nessa primeira forma, conforme previsão dos atos constitutivos da devedora sociedade empresária (parágrafo único do art. 64, correspondendo aos cinco primeiros incisos) do caput. O administrador do devedor sociedade empresária, pessoa jurídica, portanto, é destituído de sua função, por força de um ato judicial de natureza imperativa. Ao praticar ou infringir qualquer das regras previstas nos cinco primeiros incisos do art. 64, o administrador da sociedade empresária descumpriu a norma enunciada no caput, possibilitando com isto, que as disposições do seu parágrafo único, que é uma subdivisão deste mesmo caput, lhe sejam aplicadas, querendo ele ou não. Pode e, a nosso ver, deve existir o contraditório e o amplo direito de defesa. Todavia, quando o juiz, ao verificar a infringência de qualquer das cinco primeiras hipóteses do caput, e observados os princípios citados, em cumprimento à imperatividade da norma, o destitui. Destituir, como já aprendemos com De Plácido e Silva, é demitir; destituir “designa o fato de ser alguém privado da função ou autoridade, de que era investido”. (grifamos). E destituição, conformeveremos, não significa afastamento; sequer, uma palavra é sinônima da outra (grifos nossos). Não bastasse a imperatividade da lei por si só quanto à destituição, à demissão, ao fato da privação da continuidade do exercício das funções de administrador, determina ainda a lei a sua substituição – nessa primeira forma, incisos I ao V –, em conformidade com a previsão dos atos constitutivos deste mesmo devedor sociedade empresária (primeira parte do parágrafo único do art. 64). Ao prescrever o parágrafo único deste art. 64 que o administrador será destituído (e não afastado) e que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor (primeira parte), nenhuma dúvida paira para se ter a certeza absoluta que na realidade o legislador está tratando especificamente do administrador da devedora sociedade empresária, pessoa jurídica, pois só esta é que é constituída ou vem à existência através dos atos constitutivos, compreendendo-se (i) o Estatuto para as Companhias, e (ii) o Contrato Social para os demais tipos de sociedades empresárias sujeitas à recuperação judicial, e nos quais, obrigatoriamente, contém cláusulas tratando da administração (eleição, nomeação, duração da gestão, destituições, substituições etc.). A contrario sensu, para o devedor empresário individual, pessoa física, determina a lei que a sua constituição será feita através de requerimento, o qual, antes do início das respectivas atividades deverá ser inscrito na Junta Comercial do seu Estado, contendo os dados previstos no art. 968 do Código Civil. Por óbvio, sendo ele, conforme diz a própria nomenclatura individual, não existirá neste seu requerimento de empresário, qualquer hipótese para a sua substituição, e muito menos para a sua destituição. Daí, a absoluta certeza da inaplicabilidade a ele das disposições contidas no parágrafo único do art. 64, que repetimos, visam somente o devedor sociedade empresária, pessoa jurídica, por seu administrador. A título de complementação do raciocínio e para os doutrinadores e julgadores pensarem em conformidade com os ensinamentos da LC 95/1998, o seguinte dispositivo da Lei 11.101/2005: “art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato: I (...); IV – determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores”. (grifamos). A qual devedor este inciso IV do artigo 52 é direcionado? Ao empresário individual ou à sociedade empresária? Quem pode ser destituído: o devedor empresário individual ou os administradores da devedora sociedade empresária? Aqui não se fala em afastamento, nem em gestor judicial. Por óbvio, trata-se da devedora sociedade empresária, pois só os respectivos administradores é que podem ser destituídos (parágrafo único do artigo 64). Fica a observação de que esta mesma responsabilidade – prestar informações solicitadas pelo administrador judicial –, também é atribuída ao devedor empresário individual (esta e todas as do caput do artigo 64), mas a penalidade para este é o seu afastamento, conforme dispõe o artigo 65, com convocação da AGC por determinação do juiz para a escolha do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do mesmo.

Referências COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação Judicial. 11. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2016. COELHO; Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação Judicial. 10. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2014. COELHO; Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação Judicial. 8. ed. 2. tir. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011. COELHO; Fábio Ulhoa. Comentários à nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas (Lei n. 11.101, de 9-2-2005). São Paulo: Ed. Saraiva, 2005. NEGRÃO; Ricardo. Manual de Direito Comercial e Recuperação de Empresas e Falência. 7. ed.São Paulo: Ed. Saraiva, 2012. LOBO; Jorge. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. Paulo F.C.Salles de Toledo e Carlos Henrique Abrão (coords.) 4. ed. Saraiva, 2010. BEZERRA FILHO; Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falência, Lei 11.101/05 Comentada artigo por artigo. 9. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2013. MAMEDE; Gladston. Direito empresarial brasileiro, falência e recuperação de empresas. 8. Ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Atlas, v.1. FAZZIO JUNIOR; Waldo. Lei de Recuperação de Empresas. 7. ed. rev. ampl.São Paulo: Ed. Atlas, 2015. TOMAZETTE; Marlon. Curso de Direito Empresarial Falência e Recuperação de Empresas. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Atlas, 2016. SILVA; Renaldo Limiro da. Recuperação Judicial de Empresas – Nova Lei de Falências (Lei n. 11.101/05). Goiânia: AB Editora, 2005. SILVA; Renaldo Limiro da. A Recuperação Judicial Comentada Artigo por Artigo (Lei 11.101/05). Belo Horizonte: Del Rey Editora, 2015.


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