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A DISPENSA DE CND PARA A CONCESSÃO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL APÓS A LEI 13.043/14

  • Cássio Cavalli
  • 3 de fev. de 2016
  • 4 min de leitura

Por Cássio Cavalli.



A promulgação da Lei 13.043/14 a disciplinar um parcelamento “especial” do passivo tributário federal de empresas em recuperação judicial criou uma dúvida acerca da possibilidade de continuar-se a dispensar a apresentação de certidão negativa de débito tributário ou de certidão positiva com efeitos de negativa para conceder-se recuperação judicial.


É que a jurisprudência consolidada nos tribunais (primeiro por decisões paradigmáticas de primeiro grau, como as lavradas pelos magistrados Luiz Roberto Ayoub, no caso Varig, e Alexandre Lazzarini, no caso Parmalat, cuja decisão encontra-se aqui , – neste último caso, aliás, houve o fundamental, profundo e precursor parecer do promotor Alberto Camiña Moreira, – seguidas por decisões de segundo grau, até que o STJ adotasse a mesma orientação) dispensava a exigência contida nos artigos 57 e 68 da Lei 11.101/05, replicadas nos arts. 191-A e 155-A, § 3º, do CTN, para fins de concessão de recuperação judicial.


O argumento que possibilitou a consolidação desse entendimento jurisprudencial consistiu no fato de que a ausência de regulamentação do parcelamento especial para pagamento do passivo tributário de empresa em recuperação judicial criava umalacuna no sistema recuperacional, que impunha às empresas a necessidade de quitar a integralidade do passivo tributário ou aderir ao parcelamento ordinário em vigor referido no § 4º do art. 155-A do CTN, no qual lê-se: “A inexistência da lei específica a que se refere o § 3º deste artigo importa na aplicação das leis gerais de parcelamento do ente da Federação ao devedor em recuperação judicial, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela lei federal específica.”


O parcelamento ordinário de tributos federais é permanente e permite que se pague o passivo tributário em até 60 meses.


A jurisprudência consolidada entendia que esse parcelamento ordinário era absolutamente insuficiente ao objetivo de preservar-se a empresa, razão pela qual autorizava a concessão da recuperação judicial com dispensa de apresentação de certidões negativas ou positivas com efeitos de negativas.


O Fisco não se deu por rogado e em 2014 fez promulgar a Lei 13.043/14, em cujo art. 43 dispôs sobre o parcelamento do passivo tributário de empresas em recuperação judicial. Com esse movimento, esperava o Fisco que a jurisprudência passasse a exigir a apresentação de certidões negativas ou positivas com efeitos de negativa para fins de concessão de recuperação judicial.


Ocorre que o parcelamento regulamentado pela Lei 13.043/14 de especial nada tem. A empresa devedora precisa confessar todas as suas dívidas tributárias (mesmo as prescritas) e aderir a um parcelamento de até 84 meses. Como se vê, o prazo previsto na Lei 13.043/14 é muito próximo ao do parcelamento ordinário de 60 meses, que fez com que a jurisprudência passasse a dispensar a apresentação de CNDs e CPcEN para a concessão de recuperação judicial.


O fundamento da jurisprudência consolidada nos tribunais fundava-se em uma análise meio-fim, isto é, na inadequação do parcelamento ordinário para promover a preservação da empresa.


A necessidade de adequação entre meios e fins, enquanto exigência constitucional a permear todo o ordenamento jurídico brasileiro, continua a orientar a análise da relação entre a regulamentação do parcelamento tributário de empresa em recuperação e o fim de preservar-se empresas.


A questão que se coloca, portanto, não é se existe ou não, formalmente, uma lei a regulamentar o parcelamento do passivo tributário de empresa em recuperação, mas se o parcelamento existente, qualquer que seja ele, constitui meio adequado a promover-se o fim de preservar empresas. À toda evidência, parcelamento de até 84 meses de especial nada tem e, mais do que isso, é inadequado a promover o fim de preservar empresas.


Por essa razão, nos casos concretos de recuperação judicial deve-se continuar a dispensar-se a exigência de apresentação de certidões para fins de concessão da recuperação judicial, ante a manifesta inadequação do parcelamento contido na Lei 13.043/14 a promover o princípio da preservação da empresa.


No caso paradigmático da recuperação judicial da Proen, o Des. Luciano Rinaldi, da 7ª Câmara Cível do TJRJ, proferiu minucioso e detalhado voto vencedor (o acórdão encontra-se aqui), que haverá de servir de precedente para todos os casos de recuperação judicial ajuizados após a entrada em vigor da Lei 13.043/14.


Conforme decidiu o Des. Rinaldi, a Lei 13.043/14 não justifica a exigibilidade de apresentação de CND para os casos ajuizados antes de sua entrada em vigor, ocorrida em 13.11.2014, em razão do princípio tempus regit actum, aliado à necessidade de promover-se a segurança jurídica nos casos de recuperação judicial.


Ademais, mesmo para casos de recuperação judicial posteriores à entrada em vigor da Lei 13.043/14, recordou o Des. Rinaldi que a Lei 13.043/14 é incompleta, pois trata apenas de tributos federais. Por essa razão, “o parcelamento especial concebido pela Lei nº 13.043/2014, por incompleto, não atende a exigência contida no art. 57 da LRF, devendo, por conseguinte, ser mantida a jurisprudência prevalecente na Corte Superior a respeito do tema, no sentido de permitir a dispensa das certidões negativas para fins de homologação do plano de recuperação.”


Mais do que isso, mesmo no que respeita aos tributos federais, consignou o Des. Rinaldi: “[u]rge reconhecer que, em muitos casos, os artigos 47 e 57 da LRF são inconciliáveis, levando à inviabilização dos processos de recuperação judicial e, por consequência, impedindo o soerguimento da empresa em dificuldades financeiras. Embora a homologação do plano de recuperação esteja condicionada à apresentação das certidões negativas de débitos fiscais (art. 57, LRF e art. 191-A, CTN), deve preponderar o princípio da preservação da empresa, insculpido no art. 47 da Lei Recuperacional, cujo propósito maior é proteger a fonte produtora, o emprego, a função social da empresa e o estímulo à atividade econômica.”


O acórdão do caso Proen é paradigmático e servirá a orientar os julgados dos futuros casos de recuperação judicial, assim como aqueles lavrados no início da vigência da Lei de Recuperação Judicial de Empresas nos casos Varig e Parmalat.


É reconfortante saber que o Poder Judiciário continua atento às necessidades socioeconômicas de preservação de empresas, apesar da indecorosa recalcitrância do Poder Executivo, que insiste em furtar-se a participar dos processos recuperacionais, como se a preservação de empresas não lhe dissesse respeito.

 
 
 

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