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A “trava bancária” e o Superior Tribunal de Justiça (estudo completo)

  • Renaldo Limiro
  • 22 de nov. de 2015
  • 9 min de leitura

O nosso Tribunal da Cidadania, por seus dignos integrantes das 3a e 4a Turmas, que formam a 2a Seção, à unanimidade, pacificaram o entendimento de que a denominada “trava bancária” – os empréstimos cedidos pelos bancos sob o título de cessão fiduciária de direitos de créditos, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial. Já era tempo, pois, nos diversos Tribunais deste país as interpretações das disposições deste parágrafo 3o do artigo 49, principalmente no trecho que diz “tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis(...)”, eram as mais diversas possíveis.

Diz o artigo 9o do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça que a competência das Seções e das respectivas Turmas é fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa, e que à Segunda Seção cabe processar e julgar, entre outros, os feitos relativos a falências e concordatas (Parágrafo 2o, Inciso IX), compreendendo-se aí, naturalmente, o instituto da Recuperação Judicial –Lei 11.101/05 -, que com muitas vantagens supera a concordada prevista no revogado Decreto-Lei 7.661/45.

Indagação do eminente Ministro Luis Felipe Salomão.

O eminente Ministro do STJ, Luis Felipe Salomão (integrante da 4a Turma e, por consequência, da Segunda Seção do STJ, até esta data -30.01.2014), em sua magistral obra com o Professor e ilustre advogado Paulo Penalva Santos, “Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência”, Editora Forense, 2012, p. 211, tecendo comentários sobre possíveis diferenças entre os institutos do penhor de direitos e títulos de crédito e a cessão fiduciária, indaga: “Não havendo diferença substancial (se é que existe alguma) entre os meios para recuperação de créditos objeto de penhor ou de cessão fiduciária, como antes demonstrado, o que justificaria o crescente aumento do volume de créditos concedidos sob a segunda modalidade e a proporcional redução de utilização da primeira?”. (grifos nossos).

Quem responde, com grande conhecimento de causa e com toda a autoridade que tem, é o próprio Ministro Luis Felipe Salomão que, na sequência, diz:

“de fato, é notável o aumento da frequência com que é utilizada a cessão fiduciária de direitos de crédito como garantia nos financiamentos, inclusive, nas operações de capital de giro, e a utilização cada vez mais rara do penhor de direitos de crédito, modalidade anteriormente dominante nessa forma de financiamento (Cf OZAWA, 2009). (grifamos).

A preferência pela cessão fiduciária de créditos em detrimento do penhor, ao que tudo indica, decorre exclusivamente da suposta diferença de tratamento de ambas as figuras na recuperação judicial e na falência (grifei)”. (como no original).

E prossegue, com sua maestria, o Ministro Luis Felipe Salomão:

“A jurisprudência vem tratando do tema.

O texto acima transcrito menciona acórdãos oriundos do Rio de Janeiro e São Paulo, dentre os quais alguns recursos subiram ao Superior Tribunal de Justiça.

No AG 1.250.556/RJ, houve a aplicação das Súmulas 5 e 7 do STJ, ainda pendente de apreciação de agravo regimental. O AG 1.193.357/SP não chegou a ser analisado por falta de peça. Por sua vez, o AG 1.237.549/SP foi improvido por incidência da Súmula 283/STJ.

Nenhum julgado ainda, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, destarte, analisou o mérito da questão em exame”. (grifamos)

Cronologia da consolidação da “trava bancária” no STJ.

Por certo, cumpriu-se, por fim, depois de quase 9 (nove) anos de vigência da Lei 11.101/05, a grande profecia do eminente Professor e doutrinador Manoel Justino Bezerra Filho, quando, no alvorecer deste instituto, ao comentar as disposições do parágrafo 3o do artigo 49, na obra já citada, p. 139, com grande sabedoria, afirmou:

“Esta disposição foi o ponto que mais diretamente contribuiu para que a Lei deixasse de ser conhecida como ‘lei de recuperação de empresas’ e passasse a ser conhecida como ‘lei de recuperação de crédito bancário’, ou ‘crédito financeiro’, ao estabelecer que tais bens não são atingidos pelos efeitos da recuperação judicial”. (grifamos).

Ao fazermos referências do cumprimento agora das palavras proféticas do Mestre, é porque a matéria, finalmente, chegou à mais alta Corte do país – o Superior Tribunal de Justiça -, que tem competência para o conhecimento e o julgamento das questões infraconstitucionais, como a Lei 11.101/05 – a Lei que disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.

Ressaltamos que diversos acórdãos do STJ, anteriores, e tratando dos temas falência e recuperação judicial, abordaram questões específicas sobre alienação fiduciária, onde os dignos integrantes das 3a e 4a Turmas, ao analisarem com proficiência cada questão, decidiram que, por exemplo, em ação de busca e apreensão, mas por serem os bens do devedor imprescindíveis à continuidade da atividade, e mesmo tendo passados os 180 (cento e oitenta) dias de suspensão permitida (parágrafo 4o do artigo 6o) e que o bem não se sujeitava aos efeitos do processo, que permanecesse na posse do devedor em benefício do mandamento e princípio maior – o da manutenção da atividade -, se ela é, como era, viável.

A edição da obra citada do Ministro Luis Felipe Salomão é de 2012, tendo ele e o outro ilustre autor, Professor e advogado Paulo Panalva Santos, por certo, terminado a sua escrita neste mesmo ano. Como disse o Ministro, até aquele momento, no âmbito do STJ, nenhum julgado, ainda, tinha analisado o mérito daquela questão que, a nosso ver, lhe parecia desde então intrigante - inferências nossas frente à sua conclusão acima por ele próprio grifada, sobre a preferência pelas instituições de créditos na concessão de empréstimos garantidos por cessão fiduciária de direitos de crédito diante da utilização cada vez mais rara do instituto do penhor de direitos de crédito.

Cinco julgamentos do STJ consolidam a trava bancária.

Cinco acórdãos do STJ resumem a evolução do tema trava bancária naquela Corte, até se chegar à sua consolidação, conforme veremos mais adiante, nas palavras do eminente Ministro Sidnei Beneti. Coincidentemente, o primeiro onde se tratou do tema foi na Egrégia 4a Turma, integrada pelo eminente Ministro Luis Felipe Salomão que, inclusive, no Resp número 1.263.500 – ES, julgado no ano seguinte à publicação de sua obra acima citada, exatamente no dia 05.02.2013 e publicado no Dje de 12.04.2013, foi o próprio que levantou a questão da trava bancária.

Resp número 1.263.500 – ES: o primeiro.

No Resp acima citado, onde foi Relatora a eminente Ministra Maria Isabel Gallotti, a ementa e o acórdão tiveram a seguinte redação:

“EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONTRATO DE CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DUPLICATAS. INCIDÊNCIA DA EXCEÇÃO DO ART. 49, § 3º DA LEI 11.101⁄2005. ART. 66-B, § 3º DA LEI 4.728⁄1965.

1. Em face da regra do art. 49, § 3º da Lei nº 11.101⁄2005, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial os créditos garantidos por cessão fiduciária.

2. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Ministro Luis Felipe Salomão, dando parcial provimento ao recurso especial, divergindo parcialmente da Relatora, e os votos dos Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Raul Araújo acompanhando o voto da Ministra Relatora, a Quarta Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, com ressalvas do Ministro Luis Felipe Salomão. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Raul Araújo Filho votaram com a Sra. Ministra Relatora”.

Resp número 1.202.918 – SP.: O Segundo a tratar da trava bancária.

O segundo Resp, como já se disse, na ordem cronológica, que trata da trava bancária é o de número 1.202.918 – SP, só que na outra Turma, a 3a, tendo como Relator o eminente Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado cerca de 30 (trinta) dias após o primeiro acima, isto é, no dia 07 de março de 2013, com a respectiva publicação no DJe dois dias antes da publicação daquele, ou seja, em 10.04.2013. Recebeu a seguinte ementa e e o respectivo acórdão:

“EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO GARANTIDA POR CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. NATUREZA JURÍDICA. PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO AO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. "TRAVA BANCÁRIA".

1. A alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, possuem a natureza jurídica de propriedade fiduciária, não se sujeitando aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101⁄2005.

2. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Terceira Turma, por maioria, negar provimento ao recurso especial. Vencido a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino.”

Terceiro Recurso EDcl no Recurso em Mandado de Segurança número 41.646- - PA

Novamente, a 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça volta a julgar uma questão análoga, tendo como Relator o eminente Ministro Antonio Carlos Ferreira, agora no dia 24 de setembro de 2013, porém, com publicação no dia 11.10.2013. A questão, à medida que vai chegando para conhecimento e julgamento da mais alta Corte brasileira para questões infraconstitucionais, nesta hipótese, tudo foi tomando a mesma direção e o mesmo entendimento tanto na Terceira quanto na Quarta Turmas – a de que os créditos garantidos por cessão fiduciária de recebíveis não se sujeitam à recuperação judicial, e, a exemplo da citação anterior da 3a Turma sobre um julgamento desta 4a, esta, no presente caso, já cita o julgamento daquela, além de rememorar o seu.

A Ementa e o respectivo acórdão receberam as seguintes redações:

“EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO EMPRESARIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. CARÁTER INFRINGENTE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO GARANTIDA POR CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. NATUREZA JURÍDICA. PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO AO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

1. O nítido caráter infringente das razões dos embargos de declaração autorizam o seu recebimento como agravo regimental em homenagem aos princípios da fungibilidade recursal e da economia processual.

2. Os créditos garantidos por cessão fiduciária de recebíveis não se sujeitam à recuperação judicial, a teor do que dispõe o art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101⁄2005.

3. No caso concreto, foi determinado nos autos de recuperação judicial que instituição financeira devolvesse, diretamente à empresa recuperanda, os créditos recebidos por cessão fiduciária. Tal decisão representa violação frontal à norma jurídica, uma vez que os créditos garantidos por cessão fiduciária não se subsumem aos efeitos da recuperação judicial (art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101⁄2005), impondo-se, em consequência, a sustação de seus efeitos lesivos ao direito do embargante.

4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se dá provimento.

ACÓRDÃO

A Quarta Turma, por unanimidade, recebeu os embargos de declaração como agravo regimental e deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.”

Quarto Recurso AgRg no Conflito de Competência número 124.489 – MG.

O julgamento da presente questão tem uma singularidade que os demais citados e analisados acima não tiveram: o órgão julgador aqui é a Segunda Seção, ou seja, todos os ilustres Ministros integrantes das Terceira e Quarta Turmas para julgar questão semelhante. O resultado? Imaginem!

Neste Recurso o Relator é o ilustre Ministro Raul Araújo, e o respectivo julgamento ocorreu no dia 09 de outubro de 2013, com publicação no dia 21.11.2013. Ementa e acórdão receberam as seguintes redações:

“EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO LIMINAR EM CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXECUÇÃO DE CÉDULAS DE CRÉDITO GARANTIDAS POR AVAL E ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSIBILIDADE. INCLUSÃO DOS COOBRIGADOS NO POLO PASSIVO. PERTINÊNCIA. NÃO SUBMISSÃO AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

1. A cessão fiduciária de direitos sobre títulos de crédito, possuindo a natureza jurídica de propriedade fiduciária, não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial (art. 49, § 3º, da Lei 11.101⁄2005). Não ocorrência, na hipótese, de peculiaridade apta a recomendar o afastamento circunstancial da regra.

2. Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso ( art. 49, § 1º, da Lei 11.101⁄2005).

3. Agravo regimental desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Seção, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Nancy Andrighi e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sidnei Beneti”.

A estas alturas, o entendimento daquela Egrégia Corte – a Segunda Seção -, já se encontrava pacificado sobre a questão, com citações e transcrições dos acórdãos aqui referidos, mencionados e analisados.

Quinto e último Recurso AgRg no Recurso Especial número 1.326.851 – MT.

O Relator deste recurso é eminente Ministro Sidnei Beneti, tendo o mesmo sido julgado em 19 de novembro de 2013 e publicado no dia 03.12.2013. Embora a situação já esteja mais que pacificada, conforme vimos acima com o acórdão da Segunda Seção (Terceira e Quarta Turmas), este acórdão é de origem da Terceira Turma, mas entendemos transcrever parte do mesmo e ressaltar que, doravante, seja por qualquer uma das Turmas ou mesmo pela Segunda Seção, desde que o objeto do julgamento seja esta questão da trava bancária, o que se vai ver nos acórdãos sãos as referências e repetições dos julgados passados semelhantes. Como este, cuja ementa e relatório, receberam as seguintes redações:

“EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITO GARANTIDO POR CESSÃO FIDUCIÁRIA. NÃO SUBMISSÃO AO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRECEDENTES.

1.- Conforme a jurisprudência das Turmas que compõem a Segunda Seção desta Corte o crédito garantido por cessão fiduciária não se submete ao processo de recuperação judicial, uma vez que possui a mesma natureza de propriedade fiduciária, podendo o credor valer-se da chamada trava bancária. (grifamos).

2.- Agravo Regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente), Ricardo Villas Bôas Cueva, Nancy Andrighi e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator”.


 
 
 

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